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Humorário

(um diário de rir para não chorar)

(um diário de rir para não chorar)

Humorário

04
Ago21

Um gémeo para cada nação

Humorosa

Gostaria muito de começar este post como o tinha idealizado hoje de manhã, quando o meu humor ainda não tinha decaído como um isótopo radioativo em fim de vida.

Adoraria escrever a maravilhosa carta de amor ao meu corpo, pedindo-lhe desculpa por todas as vezes que o maltratei, por todas as vezes em que o negligenciei e por todas as vezes me esqueci que o tinha. 

Queria pedir-lhe desculpa por todas as vezes em que o obriguei a fazer coisas que não queria, a percorrer distâncias enormes sem necessidade, a comer mais do que aquilo que precisava, a não descansar o que devia. Queria pedir-lhe desculpa por tudo isso, numa tentativa romântica, ainda que utilitarista, de ver se os meus espasmos decidiam ir assombrar outros gémeos que não os meus.

Como sou das perspectivas holísticas e integrativas sei bem que o que acontece no corpo é um grito de ajuda, mas a verdade é que me sinto uma mãe completamente inútil e incapaz de acomodar este choro que não entendo. 

Já fui a massagens de relaxamento periodicamente, já lhes dei de beber chá de camomila a rodos, em pachos como antigamente, massajei com amor e carinho, meditei, relaxei, fiz acupressão, acupuntura, comi bananas, estou a tomar ácido fólico, âmpolas que potenciam o trabalho do fígado, meditações de gratidão, escrita criativa sobre eles, desenhos criativos, enfim, todo um enorme manancial de técnicas e técniquetas e criatividades e mesmo assim, não há sentimento mais prevalente do que esta ingratidão por parte deles, que podiam simplesmente já ter decidido dar-me tranquilidade mental.

Não há nada mais irritante que é eu estar neste meio caminho, neste percurso intermédio, nesta pausa forçada, e ainda ter a sensação angustiante que posso ter para aqui uma bosta de uma doença qualquer com a qual vou ter que conviver durante o resto da vida. Sei que isto é pensamento catastrófico. Sei que isto é enviesamento. Mas puta que pariu... deixem-me dizer isto porque é isto que eu sinto. Tenho um medo enorme. São 2 meses e uns dias e eles continuam a bombar qual coluna de som em pleno woodstock. O médico diz que é ansiedade. O médico queria dar-me ansiolíticos e um relaxante muscular oral para mandar abaixo a tensão muscular. O médico quis, mas desta vez consegui verbalizar que eu não queria. Que eu não queria ficar a babar-me, com náuseas de adaptação ao medicamento, quando eu me sinto bem. Neste momento é só mau feitio, e acontece apenas por já terem passado 7 meses e eu ainda não ver um futuro profissional à vista, estar farta de conviver com as mesmas pessoas, nos mesmos sítios, no mesmo esquema casa-passa-se-dia-noite-tv-cama. FARTA sabem?

Farta desta incerteza misturada com a certeza dos dias. Um certo que me prende a uma incerteza. Uma incerteza que me prende ao certo. Uma dança e uma paralisia, ambas, em simultâneo, como o corpúsculo-onda átomo de que somos feitos. A dualidade na sua essência. A dualidade que não separa mas que parece tanto que separa.

Os dois gémeos. A separação de uma perna em cada nação. Uma nação conhecida à qual posso voltar e garantir a segurança da sobrevivência e outra nação, um quinto império que não vejo mas que intuo que existe e no qual almejo vir a cumprir o meu propósito.

Estou na jornada do herói. Em mais uma. A matar dragões. A encontrar mais sombras. A perceber que o mundo se faz nesta dança do "do nothing-do something". E a perceber que eu deixei de dançar há uns tempos e de repente tenho este convite que a vida me está a fazer para seguir a fanfarra.

É como aquele rapazinho que sabemos que gosta de nós, mas é apenas o urso fofinho, e nos convida para a dança da vida dele e nós não queríamos, vamos por cortesia, meio a medo, sem capacidade de dizer que não porque acreditamos que também não virá de lá grande mal ao mundo. Mas toda a dança é passada de olho no bonzão apetecível que dança com a sua irritantemente elegante respetiva, parecendo que nunca será areia para o nosso camião.

Não quero continuar a aceitar meias. Meias são para os pés. Quero tentar levar este processo, este caminho menos percorrido, até ao seu fim. Não sei quanto tempo vai durar. Quero ter a certeza de que sou inteligente para me colocar também limites, barreiras e não entrar numa situação insustentável.

Sinto-me só. De repente parece que os laços mais próximos me abandonaram ou que estão todos mais ocupados a viver a sua vida. Sinto falta que me perguntem "como está essa procura?" "queres ajuda?" "queres combinar para falarmos sobre isso?". De repente páro e percebo que essa pessoa sou eu. Sou sempre eu. Eu que procuro o outro, porque acho que é na relação com o outro que cresço. Olho para a minha constelação de amigos, de conhecidos, de pessoas e sinto uma pequena dor.

Como é possível que existam pessoas-estrela que não me conhecendo há tanto tempo me reconduzam mais a mim do que outras de um passado diário e frequente?

Dizem que as crises levam à reflexão. Eu sempre achei que a minha era apenas profissional. Que tonta fui. 

Como me pude esquecer que quem leva todas as personagens do que sou, quero ser, ou finjo ser, sou Eu? 

22
Jul21

"Toda a noite ..."

Humorosa

Há aquela música que canta "Inesquecível.... é o que é ... inesquecível ....."* e eu poderia substituir esta letra por "Susceptível.... é o que é... Susceptível.... é o que ela ééééééééé..." 

Estou azeda. Disseram-me isto.

Disseram-me que o meu outro lado da empatia desmedida era isto de ser susceptível, sugestionável, influenciável, manobrável, manipulável, vulnerável, impressionável e outros sinónimos que parei de pesquisar só para provar o meu ponto, que até disso já estou cansada. 

A verdade é que fiquei chateada porque isto é verdade.

Senão veja-se. Estava eu, a gerir o melhor que posso e sei os meus belos (es)pasmos continuados nos gémeos, a dormir na boa, a gerir pensamentos hipocondríacos com pensamentos super heroicos de quem já fez tudo o que podia, e por isso agora tem que esperar, e subitamente, num jantar com um amigo, ouve-o balbuciar que ele não tem andado a dormir nada e de repente, como uma gosma, entra o meu lado de auto sabotadora a relembrar-me que as minhas noites bem dormidas estavam a ser estranhas, que o normal, seria, ainda para mais com assuntos por resolver para lá dos (es)pasmos (nomeadamente, tomo a vacina do covid, tomo uma merda natural para fazer detox ao fígado depois de ter feito uma reação alérgica a um creme natural e também ele de plantinhas e o raio, quando é que vou finalmente começar a trabalhar e em quê uma vez que o meu subsídio acaba em Março do ano que vem e já estamos quase em agosto, continuo a mandar cvs? abro um negócio meu? entro mesmo pela via dos recibos verdes que para mim são tão enormes quanto um adamastor? como é que se vive esta cena de um dia de cada vez quando se é daquelas pessoas que tem uma agenda para tudo? E como é que continuo a adiar a minha vida?) e de repente... A PRIMEIRA NOITE MAL DORMIDA.

Um misto de "que se foda" e um "a culpa foi minha" tomaram-me de assalto, sempre ao som da discoteca peçonhenta do "Susceptível... é o que você é..." e no meio desta irritação, tento salvar-me a mim própria tomando um banho, abraçando a minha alma com as mãos no peito e o calor doce que me acalma quando elas lá repousam brevemente. Tem sido o meu toque, o meu "acolho-te como estás" que me tem valido.

Gradualmente nestes momentos de incerteza, dúvida e raiva, tenho procurado que a alma irrompa em minha salvação, aquela parte de mim que me acolhe com a Graça divina e me relembra sem recurso a palavras, que está tudo como deve estar.

Posto isto, claro que está que a noite passada repeti a graça (sim, a graça com g pequeno, porque pelo contrário a outra Graça tem-me bafejado bastante nos últimos tempos), e já não sabia se era do calor, da "hómidade", dos chineses ou dos vizinhos que decidiram dar início à construção da capela sistina às 6h da manhã, e acordei novamente com uma sensação de frustração de criança. Aquela sensação de quem quer comer gelados o dia todo como refeição, sabe que não pode, mas faz birra mesmo assim.

Ontem terminei o dia com aceitação e tranquilidade ao lembrar-me da frase que abre o livro que mais gostei nos últimos tempos (O caminho menos percorrido de Scott Peck) - "A vida é difícil", e ainda assim hoje "acordo" a desejar que fosse fácil, como o comum dos mortais (que também sou), a praguejar que este gémeos nunca mais voltam "à normalidade", com medo da morte (como de costume...), com medo de que passe o tempo e eu não o agarre nesta viagem de regresso a mim.

Sinto-me tão a cheirar-me, a quase-chegar-a-um-bocadinho-mais-Eu, que não queria perecer agora, não agora que estou tão perto de mim, tão quase-a-chegar-me, quase-lá, não quero quase-lá-chegar, quero viver o tempo suficiente em Graça, ou com pequenos momentos de Graça que me convençam que estou no Caminho, seja do bem-estar, seja da paz-que-quero-ter-quando-morrer.

Se por um lado saber que vou morrer me acelera esta urgência do Hoje, por outro lado angustia-me com a previsão de um amanhã que desconheço. 

Faço birras de criança porque queria que as decisões fossem mais fáceis, mais preto ou branco, mais isto ou aquilo, mais como as lentes dopadas que eu uso e que me faziam crer que o mundo funcionava de forma binária. Mas não. Tenho vindo a descobri-lo num espetro de escolhas sarapintadas por cores num degradé que nem sequer é perfeito, tal como a vida, e ainda assim perfeito na sua imperfeição de ter tanto dentro de si invisível a alguns olhos.

Encontro-me com a leveza numa música que toca, um piano que acolhe por dentro esta dor-de-ser, esta tentativa de viver-para-além-da-dor-da-existência, nesta leveza que tanto me caracteriza e que leva pessoas a reagirem por perto, como o senhor que me mudou o contador de gás ontem, dizendo que "era preciso mais pessoas assim bem dispostas como a senhora, anda tudo tão para baixo", este mesmo senhor, que sendo mais velho que o meu pai, me dizia que não sabia escrever a palavra "dígito" e eu, com a humildade, cuidado e carinho que tenho pelo processo de ensino que me sustenta como pessoa, lhe soletrei letra por letra, num processo cuidadoso e amoroso de quem ajuda a elevar o outro, como só a minha alma me grita para fazer. Esses são os momentos em que não duvido, em que a convicção é tanta, que eu sei que só posso fazer isso. Isso e os momentos em que ajudo ocasionalmente desconhecidos a pagar as suas compras, pagando eu em cartão, porque naquela caixa não lhe era permitido o pagamento em dinheiro, ou indico onde está o caldo knorr mesmo não sendo empregada da loja... 

Nada disto me retira, tudo me acrescenta.

E aí não tenho dúvidas. Essa é a minha convicção. Mas e se eu não puder fazer disso um trabalho? Mas e se eu não encontrar esse(s) espaço(s) que me acolham e que seja(m) espaço(s) que não me acossem ou expulsem? 

E depois vem-me a frase da susceptibilidade que foi acompanhada por uma ainda melhor, e tão ou mais verdadeira do que a anterior: "Quando ressoas com o outro e com as suas necessidades de forma quase automática levas deles o melhor mas o pior também. E olha que vem muita merda."

Susceptível ou não a estas palavras, fiquei sem saber como poderia resolver este problema de ressonância, e com as minhas lentes preto-e-branco, tive o instinto de passar ao polo oposto de deixar de ajudar, ensinar, envolver-me com, dinamizar, provocar o outro, na esperança de não ser contaminada com o seu lodo, já que já tenho o meu a sobrar e por vezes a extravasar.

Mas rapidamente percebi que talvez seja algo que não posso mesmo abdicar, porque poucas foram as coisas que gritaram tanto por mim como esta de me envolver no outro na tentativa de uma fusão primordial com o lugar-de-onde-todos-viemos. Há mais metafísica nisto do que só caminho a percorrer. Talvez até um destino, ou um lugar-que-preciso-de-ocupar nesta nova vez que me fiz consciência. 

Como poderão perceber meus senhores, os meus serões de conversa com o meu pensamento são qual temática da revista TVMAIS ou TVGUIA.... De um cor-de-rosa místico à procura das verdades no seio das mentiras que diariamente todos contamos uns aos outros.

Em resumo, agora que tenho cada vez mais a consciência de que vou morrer, que não controlo quando acontecerá, que não sei como será, que hoje estou aqui e amanhã posso não estar, há coisas pelas quais não quero ter que voltar a compactuar, como ter que voltar a um trabalho-subsistência-que-me-mate-lentamente, ou relações desapaixonadas que me extingam a chama que me alumia nesta terra, ou dores e doenças que talvez consiga retardar com auto-cuidado e auto-amor. Quero muito viver perto de mim. Numa relação comigo. E essa relação só é possível se for curiosa, apaixonada e criativa. Enfim... 

O tumulto voltou ao meu peito. E aqui dançou ao som do Toy - "Toda a noite.... toda a noite..."

 

___

* Referências musicais abaixo:

 

 

23
Jun21

Solta-te, liberta-te

Humorosa

Bons dias a todos e a todas e a todx e a cenas e a coisas.

Ou "Menu Bom dia!" como disse um rapazinho que ao meu lado queria pedir um Menu pequeno almoço na padaria portuguesa.

Mas adiante.

Hoje venho aqui expurgar primeiro os meus demónios raivosos, ao som do Solta-te, liberta-te, isto porque ando aqui num desatino que, ou é de estar a caminhar para cota, ou então é só aleatoriamente chato mas ainda assim irritante.

Ora pois que quem acompanha o meu rico blog sabe que eu tenho nos últimos tempos sido afortunada e me safado de problemas de maior após duas quedas, uma de cu, outra de joelhos, uma situação de desemprego, dentes do siso e lá o caralho, problemas relacionais e existenciais, e ainda - cereja no topo do bolo - lidar com a minha Ansiedade, ou miss Alice como gosto de lhe chamar que por vezes toma várias formas antes de me visitar, seja sob a forma da bela Insomnia, ou do tremelique vibrador, ou do coração-tunning-de-chelas, enfim, uma míriade de formas e desenhos que só ela sabe inventar. Às vezes vêm todos! E aí "vamos fazer uma festa....bolo e laranjada muitos doces para ti... é o teu aniversário...."*

Pois que no meio deste fadário todo, tenho agora também para tocar no álbum "disgraces not so bad because you're still alive" as seguintes músicas:

  • Allergo - uma música cujo beat é feito só com fungar de nariz, pingos de água límpida a cair em lenços de papel e um som áspero de coceira em braços humanos. O refrão é mais ou menos assim:

"Ácarosssssssssss, pêloooooooosssss,

pequenas partículas bailando ao som dos ventos

retirando-me capacidade de pensamentos

deixando vermelho o meu nariz, tal qual petiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiz...

parece constipação, mas não é não,

sei o que é sim... Atchim atchim atchiiiiiiiiiiiiiiiim..."

(obrigada, obrigada, obrigadaaaaaaaaaaaaa!)

  • Flash Lux - uma música visual, feita com dois gémeos em descanso, mas que quando observados ou simplesmente em repouso se assemelham a mesas de mistura com pads luminosos que vão libertando as cores de forma aleatória, pulsando sem que seja pedido e/ou necessário. Este é o conceito de música inaudível visual aleatória. Gémeos cujos impulsos elétricos estão ao rubro em descanso. 

 

  • L'atom dubious - uma música vibracional que só se sente mas não se ouve e que mete todos os átomos em dúvida de tão intensa que é a sua frequência. Arranha por dentro, dá desconforto e faz sentir como se todos os vidros do nosso ser se fossem partir a qualquer instante. É o som da duvida existencial. Do "o que devo fazer?" "Devo escolher uma vida mais fácil, mais em fluxo? ou devo escolher a difícil, a mais dura, a que tenho que fazer overcome para ser mais e melhor?" 

 

Por fim, the last but not the least...

  • Hippocondriah - uma música ambiente sempre presente que sussura baixinho sensualona como aquelas vozes do "me liga vai". "É desta que quinas..." "É disto que vais." "Vai ser grave..." "De certeza que é grave..." "Já viste há quanto tempo andas a ouvir essas canções? Tá grave..." "Bué grave..." "Vai ser o martírio..." "Prepara-te... Estuda tudo, aprende tudo...vais precisar". E assim, sensualona, tenta seduzir-me para o seu espaço (muito pouco) seguro onde vou ser devorada por sereias que na verdade são bichos do mar.

E é isto meus senhores, as músicas que andam a ser o meu dia-a-dia, e que rolam pelo altifalante do meu ser.

Fui...

(só ali baixar o volume).

 

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* Música referenciada:

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