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Humorário

(um diário de rir para não chorar)

(um diário de rir para não chorar)

Humorário

28
Mar22

Espaço no tempo

Humorosa

Preciso de espaço no tempo. Mesmo as jornadas do herói mais bonitas e inspiradoras precisam de pausa. De momentos onde contemplando os reflexos do que nos estamos a tornar, nos fundimos numa reflexão profunda sobre onde estamos e para onde queremos ir. Tenho por hábito ir a fundo nas minhas emoções. Torço-as, remexo-as, revolvo-as, retiro delas as lições que penso conseguir. E é importante. Sem isso não me consigo organizar. No entanto sei que o faço no desespero de querer transformar em cores as dores, porque sinto que já sofri demais. Como se isso sequer pudesse existir. Olho para as sensações desagradáveis como uma cruz que carrego e esqueço-me que são elas as guardiãs do meu corpo. Quero bani-las, quero sempre sentir-me bem. Quero estar sempre on. Quero não sentir o que sinto e no entanto ensino aos outros o que pelos vitos tenho que integrar de uma vez por todas... A dor é precisa e dá luz. Dá luz sobre o precisa ser visto, olhado e reparado. E então tenho que ver que tipo de dor é.... olhar para ela nos olhos, ver se são resquíssios de um passado que fui, ou se são pilares da minha identidade dos quais não posso abdicar. Mas para isso preciso de criar espaço no tempo. Criar espaço no tempo. Encontrar espaço para mim no Tempo. E dar tempo neste espaço.  

25
Mar22

Um cansaço cinza

Humorosa

É fim de semana. Sento-me no carro e sei que tenho de escrever. Parei o carro, olhei o céu, ouvi o chilrear dos pássaros lá fora, e aqui estou eu, ao volante, a escrever letras aleatórias na esperança de deitar cá para fora o peso do cansaço que me consome por dentro. A cabeça pesa. Os ombros carregam mochilas que não as minhas, e a cervical tenta endireitar-me o olhar para o horizonte de queixo erguido. Findo uma semana em que todos os dias fiz o que gostei. Porra. Nunca pensei dizer isto. Todos os dias. Mesmo no meio da agitação dos dias e das pessoas envolvidas neles, eu gostei de cada pedacinho dos meus dias. Deleitei-me neles, vibrei com eles, e como não poderia deixar de ser, acabei exausta como gosto de acabar uma bela noite sexo. Aquela sensação de ser incorpóreo e do cansaço ser visceral mas com a latência nas têmporas que permite facilmente identificar o êxtase. Mas até o êxtase cansa. Ou será que o êxtase até cansa mais? Gostava de poder partilhar tudo o que tenho vivido nos últimos dias com alguém que só tivesse ouvidos-coração para mim. Que simplesmente me aceitasse no palco do seu espaço e se deleitasse com as histórias das vidas que tocaram a minha. Gostava de encontrar-me com alguém que se entusiasmasse ao mesmo nível que eu com as pequenas histórias quotidianas que têm tanta riqueza. O bronco que afinal é sensível e desenha lindamente. A angolana que não consegue expressar-se mas que hoje já opinou como observadora fiel e atenta. A confiança que lhes vejo nos olhos passadas estas sessões. Acho que eu própria ainda não tenho palavras para o tanto e o tão pouco destes meus dias. E ainda assim queria tanto verborrear e perder-me na imensidão destas histórias para que eu própria pudesse dar-me ao luxo de me distrair do cansaço bom, sabendo que as sementes que vou deixando foram deitadas em terra arada revolvida nas manhãs de um acordar difícil por não gostar de manhãs, mas beijadas pela chuva que se entranhou todos os dias, por vezes sem saber como, nos sulcos que ia tacteando talvez por intercessão da Mão Natureza Divina. Cantei muitas vezes baixinho no coração: Senhor faz de mim um instrumento, da tua paz, do teu amor... E acho que tem sido assim. E fico cansada, mas feliz.

20
Mar22

Paciência

Humorosa

O céu acordou zangado e triste. Rosnou feroz, dissipou-se, deixou o sol espreitar e voltou a fazer-se bruma. Trago no peito o espelho que aponta para o céu de hoje. Nele acontece tudo à imagem e semelhança do Grande Rio Celeste. O que está fora espelha o que está dentro. E não poderia ser de outro modo. Pedi ajuda à Voz Superior muda para que o meu peito pudesse dizer-me a verdade e nada mais que a verdade. Quero apressar essa verdade como quem quer que chova para que as barragens encham de uma vez. Este pinga pinga está a deixar marcas indeléveis nas paredes, como pinturas rupestres que ao fim de anos mil ainda cá estarão de tanto toca e foge, de tanto ir e vir, de tanto vai não vai. Pedi ajuda à Mãe Natureza. Quis hoje replicá-la enquanto ser criador e como homenagem gostaria de lhe ter oferecido um filho seu na totalidade. Não o consegui parir de uma vez. Foi a segunda vez e ainda assim não o pari por inteiro. Nem mesmo trabalhando com paciência, tempo e mais Paciência. Não ficou terminado. Não era o tempo de nascer por completo. Não era o tempo de nascer e pronto. Apressei-o, como apresso o meu peito a cuspir-me esta vontade de parar com os erros e falhas e desilusões. Mas "o erro não é desculpa para não tentar outra vez". E fico assim, de perna aberta, em cima da mesa de operações com a criança meio dentro, meio de fora, numa agonia que só qualquer mãe suportaria por Natureza, e desespero. Só queria que saísses já. Só queria cortar a dor pela raíz de uma vez por todas.

16
Mar22

Tenho palavras a rebentar-me o peito

Humorosa

Palavras que levam consigo a desilusão, a frustração e a minha tão fiel companheira - a raiva. E de repente a pressa e a urgência. De repente a ansiedade e a confusão. E de repente a mudança ao virar da esquina. O imprevisto. O imprevisível. E eu sempre feita artista de circo a tentar adaptar-me convenientemente e se possível sem dor ao novo fluxo do rio que agora desvia, e que agora corre de outro modo, que nem sei para onde corre, nem sei se vai correr para onde quero que corra, nem sei sequer se passará a correr ao contrário. Lá fora a poeira deixa barro em pó em cima de tudo quanto existe. Talvez nos esteja a convidar a ser mais moldáveis, mais flexíveis, mais adaptáveis. Mas nem isso nos facilita esse Grande Rio, porque se queres fazer desse pó barro, tens que mexer o cu e juntar-lhe água. Nunca nada vem assim, de graça. É como os almoços. Pagam-se sempre não é? E a assistir a esta jigajoga contemporânea fico eu, a olhar com ar confuso e a coçar a cabeça, sem saber se estou sã ou se já sou um zombie como todos os que me parecem rodear. Sinto o cheiro de caos no ar e o meu corpo retesa-se a antecipar a guerra que já começou, de novo. Lá vamos nós empurrar a pedra rolante montanha acima. Bora Sísifo, tás comigo, eu tou contigo puto!

13
Mar22

Dias

Humorosa

Ontem foi um dia chuvoso. Choveu de manhã à noitinha e o nevoeiro instalou-se no meu peito. Precisava de deitar cá para fora tudo o que sentia. Precisava de ficasse claro o meu desapontamento, a minha angústia, a minha sensação de exaspero, de quase não conseguir mais esticar o meu elástico-coração. Voltámos à encruzilhada do costume. Voltámos aquele lugar de onde saímos algumas vezes mas sem resolução definitiva. E ontem em desespero só queria uma resolução. Já estava na baía do despeito, no limiar do masoquismo de preferir que doesse tudo agora. O caos tinha-se instalado de novo e por isso eu só queria fugir. Eu que sempre lutei, só queria fugir. Fugir desta dor que há-de-vir, desta previsão de caos instalado, destas incertezas-alterações-mudanças. Estou alerta. Estou alerta em todas as áreas da minha vida e eu só queria poder estar tranquila. Poder desfrutar das pequenas conquistas com espaço, com doçura, e não atropelando os espaços para os poder e obrigar a sentir. Depois da tempestade veio o dia de hoje, cinzento com sol, quente com frio, embaraçoso e confortável. Um dia meio-meio, um espaço-tempo indefinido, e mais um dia diferente, mas ainda assim tão parecido a tantos outros desta amálgama de meses que temos vindo a passar juntos. A ligação está a perder-se. E eu não queria nada. Só não sei se é medo, se é ainda amor ou que dele resta. E queria tanto acelerar o processo para descobrir. Para não ter que andar de peso no peito a carregar sorrisos felizes a outros e a envolvê-los nos meus processos e paixões. Tenho tantas saudades de ter um grupo de amigos. De não ter que ser sempre eu a ter ideias sobre onde ir, o que fazer e que brincadeiras fazer. Levem-me. Obriguem-me. Forcem-me a descobrir novas cores, texturas, sabores, mesmo que eu fique contrariada. De repente tenho saudades dos tempos em que pouco ou nada decidia mas que por passivamente aceitar era arrastada para sítios onde nunca teria estado se assim não fosse. Hoje esses sítios são meus. E hoje gosto deles. E todos trabalhamos uns para os outros, todos trabalhamos uns com os outros, desenvolvendo-nos na relação com eles, e todos saímos melhores, Maiores.

Hoje foi um dia-entre-os-dias diferente e ao mesmo tempo igual. Um dia de lugares conhecidos, lugares conforto, que apesar da minha irrequieta impaciência não pude negar. Tentei desfrutar deles o melhor possível, tentei sentir-me grata pela variedade dentro da normalidade de outrora. E voltei a sentir o quão difícil por vezes é ser eu. Pareço sempre a impaciência-furacão da rotina, e quando ela se abate sobre mim é como se o adamastor me abraçasse com a sua bocarra enorme e me enviasse para o fundo da terra, num lugar sombrio onde os dias parecem ser apenas tic tacs de relógios. A cabeça que tenho hoje está baça, os olhos doridos, o corpo meio enrolado numa falta de energia que já deu o que tinha a dar. E no fundo do meu peito a minha criança grita: Porquê é que tem que ser tão complicado sempre? Não gosto que doa. Não quero que doa. Quero o meu unicórnio de volta! A minha fada! O meu jardim mágico e secreto onde tudo corre bem. E eu, grande, a Adulta, olho-a nos olhos como posso, com as feridas abertas que tenho, e abraço-a apertadinha segredando-lhe ao ouvido: "Eu estou aqui. Está tudo bem."

E de mãos no coração continuarei a seguir. 

(E a vida continuará também a empurrar-me nas suas surpresas)

Tentarei confiar mais.

11
Mar22

Agarro-me a mim

Humorosa

Agarro-me a mim como quem se agarra à vida. Tento fazer o que preciso para ser e estar feliz. Luto por isso, procuro isso, tento aprender mais sobre isso. Ligo-me à vida através das minhas paixões. Estar entre pessoas, rodear-me de conhecimento sobre elas, sobre mim, sobre o cérebro, sobre as nossas interações. Quero desesperadamente juntar as peças soltas do manual de instruções do organismo em que vim à vida, para entender como tirar melhor partido delas, e não descobrir só passado algum tempo que o botão que uso habitualmente para tirar o meu descafeinado longo não foi dimensionado para longos mas sim para tisanas. Só para isso. Para saber como ser melhor eu. Como viver esta vida, experienciá-la e retirar o maior partido das suas vivências e aprendizagens. Recordo aqueles momentos em que o ar me faltou pela loucura bravia no peito do desafio de todas as crenças e perigos. Inconstante fui. Mas vivi. Vivi momentos que guardarei para sempre e reviverei para sempre na memória. Entreguei-me ao caos, procuro agora a paz. Procuro fazer com que todos os dias valham a pena. E queria tanto partilhar-me com o mundo, com os outros, chegar aos outros, impactá-los, permitir-me partilhar as minhas vivências e experiência com os outros, de forma a que sinta que ela foi ou virá a ser útil a outro ser humano, tal como outras experiências de outros seres também o foram para mim. Quero aprender com os outros, quero estar neles, quero envolver-me neles, quero sentir-me parte. Mas de repente ninguém parece estar disponível. De repente a única coisa que vejo são vidros partidos e reflexos de algo que se aparenta com uma vida que se tenta viver no meio do caos nosso de cada dia. Estão (estamos?) todos a tentar sobreviver. Gosto de ser contaminada pela vida dos outros, pelas suas aprendizagens, pelas suas gargalhadas e dores. E gosto de me refletir neles, e de refletir sobre eles, e partilhar a minha visão sobre tudo isso com quem está ao meu lado. Dizem-me que bombardeio a minha vida e a minha vivência, e a palavra bombardear cai no meio do meu peito a lembrar-me a razão deste blog. Ante o meu espanto de agora serem coisas melhores a serem contadas fiquei surpreendida pela indisponibilidade de me acolher também a mim tal como sou. Faltam-me amigos (continuam a faltar-me). Falta-me uma voz que me fale, que me bombardeie com as suas ideias e medos, com as suas ansiedades e paixões, e segredos ocultos. Falta-me essa intimidade. De repente não me parece tê-la em lado algum. E de repente vejo que apenas a tenho comigo. Só comigo. E agarro-me a mim. Como sempre tenho feito. Porque pelo menos comigo eu sou honesta para caralho. Digo o que gosto, o que não gosto, e posso ser quem eu sou, como sou, e opinar sem ser julgada e sem ser uma bombardeira no meio de um cenário de guerra que não é comparável ao que se passa no mundo. Estamos fodidos. Estamos todos fodidos. E o pior é que todos sabemos disso mas não mexemos uma palha para fazer diferente. Eu própria começo a perder a fé. Mas raios me fodam se não hei-de levar a bandeira em riste no meu bombardeiro a lembrar que a partilha é precisa, que a confiança é possível, e que juntos somos sempre mais fortes, mais rápidos e mais ágeis. Mas tenho que me lembrar que apenas posso fazer o convite. Não posso obrigar ninguém. Ainda assim o resultado desses convites também diz muito sobre o que deverei fazer no que diz respeito ao rumo da minha vida. Não quero perder tempo e energia onde não posso ser mais. Onde não posso ser maior. Onde não me posso expandir. Que eu tenha a clareza de ver se estou a ficar presa a uma casa que não comporte o facto de eu ser larga de ossos e eu só saber crescer. Estou hoje fragmentada, estamos todos em estilhaços, mas continua a ser da nossa responsabilidade voltar a "juntar esses caquinhos e fazer um Gaudi".

07
Mar22

Voltei com indignação em riste

Humorosa

Engasguei-me ao almoço. Logo depois de ter pensado para comigo: "Finalmente um pouco de paz, a minha comida de eleição e sem o stress de andar a fugir de vespas ou abelhas." O vinagre entrou-se-me para onde nunca deveria ter entrado, e a juntar à ainda gosma pos-covidiana, um bocado de tofu triturado avulso, vi-me e desejei-me. Tossi e tossi, e cuspi no prato, e ainda tossia quando ao levantar o olhar em busca de ajuda, vi aquilo que se assemelhou a um deserto por completo - ninguém, porra, ninguém me veio ajudar, perguntar se no meio daquela tosse aflitiva eu precisava de ajuda, e eu pensei naquele momento que se fosse para morrer estupidamente engasgada eu morria. Porque na verdade só me tinha a mim. E foi o que me bastou, como tem sido nos últimos tempos esquisitos, estranhos, angustiantes e profundamente assustadores. Não sei onde estamos. Sei que nos olhamos de lado, sei que não nos encaramos, sei que passamos para trás das costas as preocupações dos outros até porque "já tenho muita coisa com que lidar", e continuamos cegos, cada vez mais cegos, para a relação de independência que queremos forçosamente reivindicar quando não essa não é de todo a realidade. No dia em que sentirmos na pele o olhar de indiferença de um médico que faz desapaixonadamente o seu trabalho, ou do pedreiro que falhou o compromisso de iniciar as obras e nem sequer avisou porque não temos que estar a justificar-nos aos outros, ou do nosso filho que olha para nós apenas como líder autocrático e por isso não sabe nem quer o calor do nosso beijo (beijo? isso é para os fracos e para as meninas!), ou quando as pessoas da tua equipa se decidem despedir e tu sabes isso não por elas, mas pela autoridade em reunião convocada de última hora à laia de uma notícia mal parida da cmtv.

Eu resisto.

Eu resisto a isto e apenas me revolto para fazer o que está escrito para mim.

Eu vou continuar a empatia, o cuidado, o afeto, a genuina preocupação com estranho que passa por mim no ikea e se senta desamparado no meio do corredor apenas para "descansar um pouco", a genuína colaboração com as associações de animais mesmo quando não tenho um, a imediata reação de procurar no meu saco de comida o que posso dar a quem me pediu diretamente "tem algo para eu comer?", ou aquele clássico de uma montra de livros a cair no chão e ajudar a senhora a apanhá-los. Não quero com isto vangloriar-me, esse não é o propósito. Quero apenas lembrar-me a mim do que faço para também não me perder. Para que tenha em vista aquilo que quero continuar a fazer: Aquilo em que acredito. E se puder influenciar apenas um pequeno terreno deixando nele um punhado de sementes que assim seja, mas não morrerei sem fazer a minha parte.

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