Sou uma escritora famosa viciada em escrita noturna, sou uma mãe de uma criança à qual estão a nascer dentes e por isso não dorme, sou enfermeira a fazer turnos, sou médica a fazer banco, sou Tripulante de ambulância em emergência noturna, sou uma empresária a viajar para o Dubai ou para a Austrália com dificuldade de encaixar os diferentes fusos horários, sou segurança privada de uma obra de arte que vai ser dificilmente transferida em horário noturno para que ninguém a roube, sou uma super-heroína durante a noite a combater mal-feitores, sou uma voluntária de uma associação que distribui comida a sem abrigos todas as noites, sou uma mulher da noite a fazer pelo meu dia, sou um sem abrigo sem tecto para dormir, e de repente, tudo o que se parece passar durante a noite enquanto não durmo, e que deveria ser uma lista cómica para que eu não panique a achar que por não dormir umas noites seguidas vou morrer, parece-me apenas uma lista de empatia por pessoas com vidas tão mais díficeis do que as minhas, que diariamente sobrevivem e vivem, noites a dentro, com desafios duros de roer às costas. E eu aqui a achar-me uma coitadinha porque ando com insónias.
Ainda assim, e como isto é um humorário e não um depressário, quero lembrar-me que já sobrevivi a 100% dos meus piores dias, e que isto que está a acontecer é também passageiro.
Quero lembrar-me que já passei coisas bem piores e que sempre consegui aproveitar os dias (Carpe diem) com um sorriso por mais pequenino e tímido ele fosse.
E mais do que isso, quero lembrar-me que já que um dia vou morrer e que esta pandemia me trouxe este medo à flor da pele, caralho, vou viver cada dia como se fosse o último, deixar de me irritar com picuinhices, e tentar experienciar e vivenciar a vida, apesar de ainda ter resquícios de desmotivação associados ao meu querido perfeccionismo que quero esse sim deixar morrer.
Talvez a vida seja para feita para aprendermos a morrer todos os dias um bocadinho em prol de uma aceitação de que viemos cá mais para experimentar do que para ser feliz como nos livros das princesas.
E experimentar é o bom o mau, o humor o desumor, o feliz e o triste, é a paciência e a impaciência e toda a dança dos binómios na qual como ser humano emergimos.
Olha foda-se, e não é que isto de humor teve muito pouco?
Se calhar passo a escrever os títulos no fim.
Adiante...
A história que quero contar sobre mim neste momento é:
Eu sou forte, mas também sou vulnerável. Este momento está a ser particularmente duro em vários aspetos da minha vida. Tal como eu, muitas pessoas se encontram neste momento a tentar com as suas ferramentas construir um pequenino barco de salvação para lidar com a exurrada que se abate lá fora. Estou a construir o meu, passo a passo, dia-a-dia, e tentando que o faça de sorriso nos lábios, mesmo que por vezes me sinta frustrada pela minha própria crítica interior.
Eu tenho medo de morrer porque ninguém me ensinou como viver plenamente e eu quero muito fazê-lo.
E depois dizem-me que querer perceber como o fazer só me afasta dessa plenitude, e eu sinto que não percebo nada, e dá-me vontade de fazer uma birra como fazia em criança, sentada a amarrar o burro porque não percebo porra nenhuma.
Se calhar o segredo da vida é esse: aceitar que não percebemos porra nenhuma e ainda assim levantar todos os dias, pegar em nós e levar-nos à vida.
Se calhar é isso.
Não
percebo
porra
nenhuma.
Tenho dito.